A sondagem é recente e ilustrativa do ponto a que chegamos:
87% dos portugueses estão desiludidos com a democracia. 87%! Mas o estudomostra algo ainda mais sintomático dos tempos perigosos que enfrentamos.Diz-nos que 73% dos portugueses não acreditam que um futuro governo faça ummelhor trabalho. Daqui a desistir vai um passo. Um passo mais pequeno do que
esperamos.
São quase ¾ dos portugueses, com crise de expectativas. Para
mim serão mais de 3/4. Sendo confrontados, diariamente, com o discurso ignóbil
do empobrecimento, os portugueses já nada esperam de melhor. E enquanto nada
esperam, o desespero vai crescendo aos pouquinhos. É a janelinha ideal para o
demagogo populista surgir. Em tempos foi Sidónio Pais. Quem será hoje, aindanão se sabe.
A verdade é que, felizmente, Portugal ainda vai num estádio
muito atrasado. No resto da Europa, forças pouco democráticas. Na Grécia (ou o
Portugal, versão viagem ao futuro) já há um partido nazi no Parlamento. E, nesse mesmo país, a força “salvadora”, a
alternativa redentora é um partido com raízes na extrema-esquerda. Que Europa é
esta?
A juntar-se às sementes destrutivas lançadas pela crise
económica, junta-se outra de igual valor. Assistimos a uma deturpação de
valores. Não é só na União Europeia com a recorrente
retórica dos sulistas preguiçosos vs os nortenhos egoístas. Nota-se mesmo dentro da
sociedade, com o culto à estupidez. Falo obviamente de programas televisivos
altamente mediáticos, como é a famigerada “aposta” da TVI, a Casa dos Segredos.
Face a isto temos 1% do PIB direccionado à Cultura. E ainda se pretendem cortes
na Educação. Já dizia o realizador italiano Frederico Fellini. “A raiz do
fascismo é a estupidez”. Acrescento ainda que o fascismo não é exclusivo da
direita. Há muito fascista que se diz de esquerda. E são piores, porque são
hipócritas.
Sobre esta sociedade estupidificada pairam os abutres que se
querem banquetear com as carnes de uma democracia putrefacta E ela está, de
facto, moribunda. Precisa de ser reanimada, com recurso a uma participação
cívica mais activa. E com uma aproximação dos cidadãos ao poder. Só assim
poderemos espantar aqueles que salivam enquanto a democracia agonia.
Por isso deixo aqui um apelo a todos os responsáveis políticos
nas altas instâncias europeias (é onde a verdadeira “guerra” está a ser
travada). Vejam o que a falta de flexibilidade e concertação europeia está a
fazer. Olhem para a Grécia. Olhem para Portugal. Olhem mesmo para os paísesnórdicos.
O eurocepticismo, agarrado ao nacionalismo (que distingo de
patriotismo), cresce sem parar. Aos poucos vai tomar o coração dos europeus,
face à não apresentação de outras alternativas. A crise de expectativas vai
levar as pessoas a preferirem o caminho fácil, mesmo que não seja o verdadeiro.
Depois não digam que foi tarde demais. Nos anos 30, algo poderia ter sido
feito. Não foi. Por isso morreram 60 milhões de pessoas.
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