sexta-feira, 3 de agosto de 2012

A bola está com Draghi

Aos soluços, Mario Draghi lá vai vislumbrando uma solução: o governador do BCE, antes tão pró-alemão, começa a render-se às evidências. O Banco Central Europeu não pode continuar a fechar os olhos. Os mercados (essas entidades abstractas) salivam cada vez que se ouve falar em juros da dívida dos países periféricos. Mesmo a alegria de Vitor Gaspar foi sol de pouca dura. Depois de os juros da dívida portuguesa terem diminuído, subiram logo na semana seguinte (uma amostra da “racionalidade” dos mercados). Draghi sabe (há muito) que não pode esperar que estes, simplesmente, se “equilibrem” (já Keynes o dizia). Por isso, e antes de se instituírem reformas mais profundas como uma regulação a sério dos mercados financeiros, são necessárias medidas urgentes. A acreditar no que vai surgindo na comunicação social Draghi e o BCE para lá caminham. Não pelo seu próprio pé, mas arrastados pela força das circunstâncias. Compra mais arrojada da dívida nos mercados secundários e o famigerado “quantative easing”, que basicamente levaria o BCE a criar dinheiro e injectá-lo na economia. Claro que, outras medidas como a mutualização da dívida acima dos 60% (os famigerados eurobonds) e a revisão das taxas de juro dos países intervencionados pela instituições internacionais não foram faladas. Mas aí, a competência já é conjunta, mas creio que, a seu tempo lá chegaremos. Disse Draghi que, na reunião de governadores dos bancos centrais, estas medidas obtiveram uma votação quase unânime. Digo quase porque houve um governador que votou contra. O Bundesbank, através do seu governador Jens Weidmann opôs-se a estas medidas. Não pretendo, de maneira nenhuma demonizar os alemães. Isso além de demagógico, é perigoso. A Europa não pode correr o risco de ostracizar os alemães. É imperioso que estes se empenhem no projecto europeu e que não se voltem para dentro. Recordamo-nos dos perigos que o nacionalismo alemão pode trazer. Mas, voltando à posição alemã, devo dizer que ela é compreensível. Esta técnica do “quantative easing” acarreta o fantasma da inflação. Os alemães têm má memória de períodos inflacionistas: dizem que foi a machadada final na República de Weimar e, consequentemente, levou à ascensão do senhor que prometia todas as soluções, até aquela que apelidou de Final. Falo de Adolf Hitler, claro. Agora e socorrendo-me, na opinião de Martin Wolf, colunista do Finantial Times, devo informar Jens Weidmann e todos os restantes alemães que não foi necessariamente a inflação que levou Hitler ao poder. Foi sim a brutal política de austeridade imposta por Heinrich Brüni, entre 1930 e 1932 que levou Hitler a ter maior votação. Nos nossos dias, vejamos as apostas que os gregos, desesperados por soluções políticas não convencionais, fizeram. Estamos a jogar um jogo perigoso na Europa. Marx dizia que a história se repete a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa. Desta vez, se ela se repetir, a farsa será, certamente, grande. Mas a tragédia conseguirá ser ainda maior.

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